20100309

rascunhos - I

A madrugada se estendia pela cidade.

Cirus caminhava por entre as luzes da cidade apreciando a melancólica boêmia desse fato, a já estuprada idéia de virar a noite nas ruas sujas e movimentas. Seu olhar vago não era atraído por nada em particular, apesar de seus ouvidos captarem todo e qualquer ruído particular naquela cidade, os carros, os gritos, as conversas entrecortadas, a decadência dos fatos.

Quando seus olhos então se deram conta, ele já estava sentado confortavelmente no Late Nite, o velho e companheiro bar, de tantos anos, porres e mágoas. Cirus era um rico homem, influente, bonito, inconsequente, e o Late Nite era tudo o que ele precisava.

Seu celular o olhava de cima de sua mesa, piscando, chamando, clamando sua atenção, mas era sempre seu velho copo de whisky, o mais caro do bar, que acabava ganhando o carinho de sua mão. Sua mesa estava somente acompanhando-o, enquanto o resto do bar continuava sua vida, com muitas pessoas cuidando de seus próprios copos, cigarros e demônios.

Seu olhar vagava pelas luzes azuis suaves, pelos letreiros e rótulos refletindo o neon, atrás do barman. Barman esse que lhe acenou com certa reverência nos olhos. Cirus era rico, muito rico, afinal. Ao aceno de sua cabeça, trouxe mais uma dose a ele.

- Tudo bem com o senhor, Sr. Cirus?

Não que o barman realmente esperasse resposta, ele nunca a ganhava. Virou-se para voltar para o bar para atender um pequeno grupo de garotas.

- Tudo sim, Joe.

Voltou-se espantado para Cirus, perguntando a si mesmo como o grande Skyh Cirus sabia seu nome, até se lembrar de seu crachá por cima da camiseta de linho. Porém, o olhar de Cirus já estava longe, fixo no grupo de garotas.

Cirus atentamente observava um rosto no meio daquela pequena multidão. Ele sempre se sentia assim, um demônio olhando para um anjo. Sorriu de leve ante aquela face inocente.

- Hey, Joe. Última rodada, e por favor, chame aquela garota.

Joe seguiu o olhar de Cirus e localizou a garota. Rapidamente voltou com o drink e uma sorridente moça, dentro de seu vestido negro como ébano e olhos azuis como safiras. Seu cabelo era ouro e trovões.

- Aqui está, Sr. Cirus - disse colocando o copo e puxando uma cadeira para a garota -, com sua licença. - retira-se rápido e aí termina a sua parte naquela noite do Cirus.

"Bom garoto", ele pensa consigo mesmo.

E ela um estonteante sorriso ecomeça a falar. Sobre o mundo, sobre como a vida é, sobre os problemas no caminho. Cirus, como um bom ouvinte, somente a observa por cima da borda do copo.

Ele mal prestava atenção ao que ela falava.

Ele só queria uma coisa.

Uma coisa.



As luzes da cidade brilhavam até se perder no mar. Vinte e um andáres acima da cidade.

Ela está tão perto dele que ele sente que pode mergulhar naqueles olhos azuis. Azuis como o mar.

E é aquele momento, aquela pausa daqueles olhos, a calma antes da tempestade, que ele começa a se sentir um pouco culpado. Cirus não é um homem de culpa.

Logo irá acabar, ele pensa.

- O que você pode me oferecer?

- O que você quer? - ela responde.

- Acho que eu fico com tudo.

Ela tinha muito a dar, ele ficaria com tudo, e a luz da cidade foi testemunha.

Lentamente eles despem suas roupas, e a visão que ele tem quase brilha, brilha tanto quantos seus olhos. Olhos de demônio, ele pensa sorrindo.

Ela também sorri.

E ele quebra aquele sorriso enquanto os joelhos dela tocam o chão.

Cirus sequer se dá ao trabalho de prestar atenção, enquanto seus olhos varrem a escuridão do céu e a luz da cidade. Ele não se importava e sabia disso. Mas a culpa estava longe, a culpa não tem espaço nele, ainda mais enquanto sente aquilo que ele sempre gostou de comparar a uma descarga elétrica em todos os nervos da região que ela agora trabalhava tão intensamente, com uma vontade que não constrastava com seu rosto inocente.


thomas.

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