20081229

tonight I'll fall

Nunca coloque seu coração perto da mão de alguém.” ~Stephen King


Apoteose


Chega uma hora que todo mundo deveria parar e pensar: mas que porra é essa?

Chega uma hora em que o mundo parece rir da tua desgraça enquanto tu só se dá mal, e não é um simples mal como prender o dedo na porta de casa ou bater com a canela na quina da mesa. É um mal pior. É um mal que dói mais fundo do que tu julgava possível doer. E faz mais diferença do que tu quer acreditar.

E, diabo, pode ser que tu tenha passado todos os teus anos da tua vida te achando forte, inabalável, invencível. Mesmo assim, quando tu quebrar a cara pela primeira vez, entender a vida e ver que nada, absolutamente nada é como te disseram, vai doer. Tu verá todas as paredes que tu envolveu teu coração, aquela fortaleza antes julgada inexpugnável, sendo derrubada, esmigalhada no chão.

Quer saber o pior?

Ela vai cair porque em algum momento tu abriu o portão tão fortemente guardado pra alguma pessoa. Alguém que tu julgou confiar, ou talvez até amado. Aquela porra toda vai ao chão só pra provar que no mundo não resta nada além de ti mesmo, porque o resto pode ser só uma ficção inventada por alguma mente em coma profundo e o universo pode ser só tu. Por quê? Porque tu sempre só quis te proteger, enquanto os outros, de um modo ou de outro, só conseguem te colocar pra baixo.

Deve ser da natureza humana.

Deve ser da natureza humana confiar, amar, destruir. Por que tem que ser assim? Porque só assim as coisas funcionam. A tal da competitividade, o mundo é dos melhores blah blah blah me desculpa eu sou um perdedor pise em mim.

Porque a vida tem que ser tão difícil, quando tudo poderia ser simplificado? Porque tu não ressona na mesma freqüência? Tu ama, tu se preocupa, tu se dedica... Só pra chegar alguém lá e meter o pé na porta da tua fortaleza e pôr tudo abaixo, como se isso fosse completamente normal e aceitável.

Talvez seja.

Talvez quem pense como eu tenha nascido pra perder com um sorriso besta no rosto de quem não entendeu nada, um sorriso de compaixão, por não entender e entender ao mesmo tempo. Ou talvez por querer não entender, mesmo sabendo que no fundo entende perfeitamente, mas não nasceu com o instinto humano básico de ser um filho da puta.

Então, quando tu finalmente cai, depois de ter julgado extinguida a ferrugem do velho coração, que aquele frio fora embora, tu vê que de nada valeu cada segundo de esforço, cada lágrima engolida, cada noite de sono perdida.

Tu entende que tu nunca foi invencível, quem dera indestrutível. Tu era fraco desde o começo, tu foi fraco por confiar, tu foi fraco por amar, tu vai continuar sendo fraco até que a velha crosta de ferrugem volte a cobrir teu coração e ele esfrie de novo. E quando tu conseguir, tu de novo vai dar de cara no chão, porque tu perde a si mesmo no momento que tenta entender os outros. Tu se perde pelos outros e tu morre por isso.

Morre mil vezes se for necessário.

Morre porque é humano, porque é fraco, porque confia, porque ama.

Se fosse fácil, não teria graça. Mas ninguém nunca disse que precisava ser doloroso, mas é. Dói como o inferno, dói mais do que tu julgava poder.

Faz mais diferença do que tu quer acreditar.


Thomas Hanauer

20081228

Daqueles sem Esperança

3 da manhã e eu simplesmente não sei.

Sentado aqui nessa mesa, cheirando o cheiro úmido de suor e frustração, o suave palpar da música e da decadência. A leve fumaça do meu cigarro sobe, marcando caracóis na imensidão atômica dos meus cabelos. O copo, já vazio, quieto, me observa.
Há 15 minutos que um homem ao canto vomitou e caiu, provavelmente se afogando no próprio vômito. Pergunta se eu me importo? As prostitutas continuam dançando, os bêbados continuam se afogando e eu aqui, escrevendo. Por quê? Porque é o que eu preciso, é o que eu vou fazer pra me manter são nesse âmago da humanidade.

Sim, o âmago, a apoteose, o cúmulo. Ironicamente, é aqui onde se vê do que somos feitos. Ambições, sonhos, memórias. É aqui onde perdemos nossas ambições, enterramos nossos sonhos e bebemos para esquecer.

Mas esquecer o quê, você se pergunta? Esquecer o passado, esquecer dos velhos amores, das velhas manias, dos velhos empregos, dos velhos ditados. Esquecer que já houveram tempos melhores, esquecer que jamais existiram esperanças. Esquecer do presente, esquecer de si mesmo, esquecer de existir.

A magia etílica lentamente te leva pra onde você quer, aqui, no âmago, na apoteose, no cúmulo. Não é engraçado como tudo cai em pedaços ao seu redor? O piano martela as notas em desarmonia, assim como batem os corações das pessoas ao meu redor. A morte bebe ao lado, companheiros. Todos sabemos disso, mas pergunte se nós nos importamos?

Passamos a vida inteira andando rumo ao norte, mas damos um passo para tráz e a vida inteira andando para o norte se resume em um passo para o sul.

Poderia ser tudo de outro jeito, poderiamos ter dado certo, poderiamos estar lembrando de que ser é algo necessário, que há amor e que há esperanças. Mas o copo aguarda, a fumaça, as prostitutas e o piano. Somos, em suma, um resumo de nada que pensa alguma coisa que não existe.

E há outro modo?

Talvez houvesse. Talvez quando ainda o nosso coração batesse jovem e forte.

Agora, só a decadência, a fumaça e o copo.


Thomas Hanauer